
A Mangueira pulsa. Não como um relógio marcando horas, mas como um surdo que dita o ritmo de uma história maior que seus muros. Nos anos em que o Carnaval ainda se escrevia com letras de suor e lantejoulas caseiras, Melão surgiu — não como estrela isolada, mas como parte essencial dessa constelação verde-rosa. Seu nome, doce como o fruto e resistente como sua casca, escondia uma verdade: na alquimia do samba, os homens comuns são os verdadeiros feiticeiros. Entre as décadas de 1970 e 1990, enquanto a Escola se transformava — das festas de ala no terreiro batido ao Palácio do Samba —, ele estava lá: recolhendo garrafas vazias após os ensaios, costurando plumas em alegorias madrugada adentro, ensinando baianas a girar como planetas em torno do sol do samba-enredo. “Mangueira para mim sempre foi um idealismo”, confessou certa vez, numa frase que resumia sua devoção. Mas qual o peso de um ideal? Melão respondia com as mãos: nas asas de Mãe de Ouro que ajudou a construir (1976), no coreto de JK que ergueu (1981), nas alas reunidas que inventou para costurar a Escola em um único corpo. Esse capítulo revela suas contradições: homem de bastidor que virou lenda, brincalhão que quase causou um escândalo nacional com galinhas de mentira, ferrenho tradicionalista que ousou defender — contra todos — que os compositores deveriam cantar seus próprios sambas. Sua história se confunde com a da própria Mangueira na era da transição: do improviso à profissionalização, da espontaneidade ao planejamento, sem nunca perder o cheiro de feijoada no barracão. Hoje, quando o vento balança a bandeira no Palácio do Samba, ainda é possível ouvir ecos dessa época. Nos passos das baianas que ele ensaiou, nas fantasias que sobrevivem em fotos desbotadas, no riso que perdura nas anedotas contadas entre um gole de cerveja e outro. Vamos adentrar nos bastidores desse ícone do samba, cuja história ilumina os caminhos percorridos pela Mangueira. Boa leitura.
topo ↑
Como citar esse artigo — OLIVEIRA, Marcelo Fonseca de. “O DOCE MANGUEIRENSE APAIXONADO”. In: MEMÓRIA Verde Rosa. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: <https://memoriaverderosa.com.br/melao/>. Acesso em: 23/04/2025.
Deixe um comentário