
William Lourenço Braga, mais conhecido como Lilico, teve sua história profundamente entrelaçada à da Estação Primeira de Mangueira. Filho de d. Irene, uma baiana de tradição, e do sr. Braga, Lilico foi o caçula da família. Seus irmãos, Licinho e Cisinho, eram ritmistas. Ainda jovem, Lilico alimentava o sonho de se tornar jogador de futebol, chegando a treinar no clube São Cristóvão. No entanto, sua trajetória o levou por caminhos diferentes, onde exerceu atividades diversas, como professor de educação física e digitador no IBGE.
Nascido e criado na Mangueira, Lilico carregava a paixão pela escola desde a infância. Começou a desfilar aos sete anos como passista-mirim e, em 1975, ocupou o posto de segundo mestre-sala. Cinco anos depois, desfilou como primeiro mestre-sala, formando par com a porta-bandeira Neide. Infelizmente, Neide faleceu dois meses após o carnaval de 1980, vítima de um câncer que manteve em segredo durante muito tempo. Sua substituição veio em 1981, com Mocinha assumindo o posto de porta-bandeira e dançando pela primeira vez ao lado de Lilico. Curiosamente, na época, a performance de mestre-sala e porta-bandeira não contava pontos na avaliação das escolas de samba, uma prática que seria implementada somente em 1982.
Foi nesse contexto que a dupla Lilico e Mocinha aceitou um convite para desfilar pela Caprichosos de Pilares, onde obteve a nota máxima. “Nós ajudamos a Caprichosos a passar para o Primeiro Grupo. Hoje, me arrependo, pois eles não vão ver a hora de ‘engolir’ a Mangueira”, confessava Mocinha. Lilico manteve a excelência em suas apresentações pela Caprichosos nos dois anos seguintes, garantindo notas máximas. Contudo, em 1985, retornou à Mangueira, assumindo novamente o papel de primeiro mestre-sala ao lado de Mocinha, substituindo o lendário Delegado, que por mais de três décadas manteve um padrão de nota 10 para a Estação Primeira.
Apesar de admirar Delegado, Lilico destacava que seu estilo era diferente, inspirado nos passos de Arilton, um dos pioneiros mestres-salas da Mangueira. Sua contribuição para a escola foi interrompida por uma transformação de vida. A chegada da Igreja da Missão Batista Nacional Ebenezer ao local onde funcionava o bar Só Pára Quem Pode, um reduto boêmio do morro, trouxe mudanças significativas na comunidade. Muitos sambistas migraram para o campo religioso, incluindo Lilico, que se tornou pastor e passou a pregar contra o carnaval e até mesmo contra a Mangueira.
A história de Lilico quase foi interrompida ainda na infância. Em um acidente no morro, aos oito ou nove anos, ele caiu sobre um fundo de garrafa quebrado, causando um ferimento grave no joelho. No Hospital Souza Aguiar, os médicos cogitaram amputar sua perna, mas Roberto Paulino, conhecido como Robertinho, interveio. À época, Robertinho utilizou suas conexões no hospital para assegurar que Lilico fosse submetido a uma cirurgia reparadora. Esse episódio foi descrito por Paulino em seu livro “Do Country Club à Mangueira” (Letra Capital Editora, 2003 – p. 19): “Lilico quase não poderia ter sido mestre-sala. Quando tinha uns oito/nove anos, brincando no morro, caiu com o joelho sobre um fundo de garrafa quebrado. Fez um corte muito feio no joelho e, no Souza Aguiar, queriam amputar-lhe a perna. Usei algumas amizades que tinha no hospital e os médicos resolveram tentar uma cirurgia reparadora. Tão bem feita que Lilico chegou a mestre-sala, arrancando várias notas dez”.
Carnavais de Lilico como primeiro mestre-sala da Estação Primeira de Mangueira:
- 1980 “Coisas nossas” com Neide
- 1981 “De Nonô a JK” com Mocinha
- 1985 “Abram alas que eu quero passar – Chiquinha Gonzaga” com Mocinha
- 1986 “Caymmi mostra ao mundo o que a Bahia e a Mangueira têm” com Mocinha
- 1987 “No reino das palavras, Carlos Drummond de Andrade” com Mocinha
- 1988 “Cem anos de liberdade, realidade ou ilusão?” com Mocinha
- 1989 “Trinca de reis” com Tidinha
- 1990 “E deu a louca no barroco” com Tidinha
topo ↑
Como citar esse artigo — OLIVEIRA, Marcelo. “LILICO, ENTRE A DANÇA E A FÉ”. In: MEMÓRIA Verde Rosa. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: <https://memoriaverderosa.com.br/lilico/>. Acesso em: 21/02/2025.
Deixe um comentário